Uma perspetiva de Marketing sobre as candidaturas ao Ensino Superior

“QUEM NÃO SABE É COMO QUEM NÃO VÊ”

Quando queremos comprar um par de calças procuramos, comparamos e experimentamos diversos modelos, de várias marcas antes de tomarmos uma decisão.

No entanto, quando escolhemos o curso/ instituição de ensino superior (IES) qual o nível de informação prévia que recolhemos para fundamentarmos a nossa escolha?

Este é um tema que me volta a ocupar, agora que a minha filha mais velha está prestes a candidatar-se ao ensino superior.

Em 1998, no âmbito de um Mestrado em Sociologia que frequentei (não concluí) no ISCSP, desenvolvi o trabalho para a tese precisamente sobre o processo de decisão no contexto do acesso ao ensino superior. Já na altura – trabalhava no próprio ISCSP, como colaborador no gabinete de inserção na vida ativa – queria aplicar uma perspetiva de Marketing a esta análise, baseada nos princípios da (Sociologia da) Decisão Racional. Com recolha de dados em várias escolas da Universidade Técnica de Lisboa, da Universidade da Beira Interior e da Universidade de Coimbra, procurava saber quais os fatores determinantes para a decisão de escolha do candidato à IES e quais as fontes e níveis de informação sobre as respetivas instituições e cursos.

Uma análise que tive oportunidade de replicar, de forma simplificada, ao longo dos últimos 15 anos no IP Tomar.

Na perspetiva do aluno (consumidor) parece-me irracional basear uma decisão com impacto sobre largos anos futuros – ou sobre toda a vida, sem conhecer fatores concretos sobre o curso/ IES a que se vai candidatar (estrutura dos cursos, perfil dos docentes, saídas profissionais, alumni, serviços e condições das IES), etc.

Mas, do mesmo modo, continuo a surpreender-me com a postura de muitas IES que não comunicam, nem promovem adequadamente a sua oferta.

Apoiando a minha filha na pesquisa de cursos em diferentes instituições, deparámo-nos com vários casos sem um corpo docente devidamente identificado (CV, por exemplo), sem concretização de saídas profissionais (com exemplos de alumni), etc.

A marca (notoriedade) da IES é um fator sem dúvida importante, mas que poderá ser mais ou menos relevante em determinadas áreas de formação e, sobretudo, baseada em fatores alheados ao desempenho do serviço que oferecem. Do mesmo modo, mais do que títulos académicos (muitas das vezes distantes do contexto formativo em que os respetivos portadores lecionam), importa conhecer o perfil e a experiência dos docentes que vão ensinar os meandros e as bases de uma qualquer profissão ao aluno.

Nos sistemas anglo-saxónicos é habitual as IES indicarem o salário (ou o incremento salarial) expectável para alunos que venham a concluir os respetivos cursos. Essa perspetiva de retorno é um fator importante na decisão inicial, sobretudo na escolha da IES.

Por cá, a decisão sobre o curso/IES a escolher continua a ser muito apoiada numa suposta ‘vocação’ pessoal e, em muitos casos, na média (‘custo’ de entrada) que filtra previamente a lista de cursos possíveis de frequentar.

Existe uma fatia importante das dezenas de milhares de alunos que anualmente se candidatam ao ensino superior sem procurarem o mínimo recomendável de informação sobre os respetivos cursos/IES, do mesmo modo que continuam a existir IES que não comunicam nem promovem eficazmente a sua oferta.

Qualquer loja online cumpridora dos diretos do consumir tem a obrigação de informar sobre todos os detalhes do produto e do processo de venda. Isto permite que o consumidor possa tomar uma decisão informada e racional.

Infelizmente, por inércia do aluno-consumidor e inépcia (se existir boa fé) de algumas IES, o acesso ao ensino superior continua a ser, para muitos, marcado pela irracionalidade no processo de decisão.

Nestes últimos 20 anos, a internet veio revolucionar a distribuição e o acesso à informação… o que só torna a persistência da situação mais incompreensível.

Luís Nunes
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